sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Postagem 1

1.

(cochichando): No texto “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica” de 1936, Walter Benjamin (1892-1940) (erguendo a voz) estabelece um debate sobre a questão estética trazida pelo cinema, relacionada à crise radical do sistema tradicional das artes. Neste texto, aborda a perda da aura (pois as técnicas de reprodução ao mesmo tempo em que tornam os objetos mais acessíveis nos afastam do autêntico e da esfera da tradição). As massas podem não possuir o objeto, mas possuem a sua imagem. E, conforme estabelece, o agente mais poderoso deste processo é o cinema, que, como ele observa no caso do cinema fascista, funda-se numa percepção distraída e coletiva do público.

Assim, nesta postagem 1, vamos assistir o trecho inicial de Triunfo da Vontade, documentário realizado pela cineasta Leni Riefenstahl “retratando” a Convenção do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (Nationalsozialistische Deutsche Arbeiterpartei ou NSDAP), ou, para sermos claros, a Convenção do Partido Nazista no ano de 1934 na cidade de Nuremberg. O filme estreou em 1935. Documentário, propaganda política, manipulação das massas pelas imagens: todas estas palavras se aplicam a esta obra perturbadora. Benjamin chamou este uso da imagem de “estetização da política”.

Vou deixar aqui o trecho inicial. O restante, vocês encontram pela internet também. Reparem ao longo do documentário toda a construção ritualística dos símbolos nazistas, o uso das multidões e como a câmera sempre projeta Hitler, que interpreta a si mesmo, ao alto, rodeado e saudado pelas massas, e como grande líder.

http://www.youtube.com/watch?v=j1HBl87IBe0

Sobre este filme, Luiz Nazário, um estudioso de cinema do qual vocês encontrarão vários livros, comentou:

A câmara apanha, em angulações estáticas e simétricas, as insígnias das tropas formadas por gigantescos blocos. Em tomadas de baixo, ascendendo pelos mastros das bandeiras, sublinha as dimensões colossais do congresso. Travellings ao longo das formações militares acentuam a rigorosa ordem. Só, Hitler percorre o longo espaço vazio entre as formações do exército. Elevado acima deles à altura de uma casa, domina o mabiente desde o palanque. Não é mais possível distinguir se a câmara apanhou uma parada militar real ou se tudo foi apenas encenado para ela. O verdadeiro congresso do partido realizou-se comente no cinema: o filme criou o congresso

( retirado do livro de Luiz Nazário - De Caligari a Lili Marlene. São Paulo, Graal, 1983, p. 51)

E sobre o primeiro trecho do filme, que indico aqui para assistirmos, deixo o comentário de historiador Alcir Lenharo, que foi docente da Unicamp (e meu orientador de mestrado) e que deixou, entre outros, um notável pequeno livro cuja leitura atenta recomendo a todos vocês, intitulado “Nazismo, o triunfo da vontade”, lançado pela Ática em 1986.

Nas primeiras seqüências de O Triunfo da Vontade, Hitler chega de avião como um esperado Messias. O bimotor plaina sobre as nuvens que se abrem à medida que ele desce sobre a cidade. A propósito dessa cena, a cineasta escreveria: “O sol desapareceu atrás das nuvens. Mas quando o Führer chega, os raios de sol cortam o céu, o céu hitleriano”. Pelas imagens mágicas e aliciantes de Riefenstahl, o Führer se porta como um demagogo/pedagogo que, feliz, conduz as massas para onde desejar.”

(Alcir Lenharo, Nazismo o Triunfo da Vontade, São Paulo: Ática, 1986, p. 60).

Abraço e até a próxima postagem...aguardo vossos comentários.

5 comentários:

Guido Santos disse...

Caramba, muito bom. A forma como os símbolos foram utilizados e como Hitler é recebido pela população lembra até a propaganda política de hoje em dia. Enquanto via o vídeo, lembrei muito também dessa propaganda "clássica": http://www.youtube.com/watch?v=6t0SK9qPK8M

profa. Cristina disse...

Guido, eu havia esquecido desta propaganda...gosto de como a imagem só fica visível a uma certa distância, ou seja, tudo depende da perspectiva e de conseguir enxergar o todo. Por curiosidade comecei a ler os comentários que as pessoas postaram a partir da propaganda, e chama a atenção como alguns entendem exatamente o oposto do que a propaganda tentou dizer! Isso também tem muito a ver com a forma como os usos e re-usos da imagem, especialmente em veículos que se prestam às besteiras e ao anonimato como a internet. Ninguém com vontade de fazer uma Iniciação Científica sobre as redes sociais e a forma como absorvem os fatos da mídia?

César disse...

Por coincidência, sem ter visto o blog antes,no feriado eu vi o documentário todo.Realmente,trata-se de uma propaganda pesada em favor do nazismo.Mas, em se tratando de técnica, talvez a menor incidência de cortes de câmera em relação ao que temos atualmente me deixaram um pouco entediado,confesso. De fato, o interessante foi poder me deparar com a "alteridade do passado" por meio de uma produção cinematográfica que há muito eu estava desacostumado.

Rosane de Almeida Freitas disse...

É legal perceber como a musica também influencia. No começo surgem duas situações: na primeira quando fala do sofrimento do povo alemão a musica tem um tom mais "grave" e a segunda é quando diz que a nação reviveu , a musica ja tem uma tom mais leve, alegre como se realmete algo estivesse renascendo.

Joana disse...

No Museu Berardo, em Lisboa, está rolando uma exposiçao sobre propaganda de guerra. No cartaz de informaçoes dá para visualizar algumas!

http://www.museuberardo.pt/Files/MCB_Arte_da_Guerra_2011.pdf